A Esclerose Múltipla é um distúrbio desmielinizante imunomediado que afeta o sistema nervoso central (SNC). Na doença as células inflamatórias do sistema imunológico (incluindo células T, células B e outras) ataca

m as células e tecidos dentro do sistema nervoso central, causando inflamação e danos à mielina, fibras nervosas e células que produzem mielina. Vários fatores genéticos e ambientais que influenciam o risco para o seu desenvolvimento já foram identificados.

A manutenção da boa saúde geral é muito importante para pessoas com algum distúrbio crônico: uma dieta bem balanceada e planejada ajudará a atingir esse objetivo. Embora não exista uma “dieta esclerose múltipla” especial, “o quê” e “como” você come pode fazer diferença em seu nível de energia, função fisiológica da bexiga e intestino e da saúde geral. Os especialistas em Esclerose Múltipla recomendam que as pessoas acometidas pela doença cumpram as mesmas recomendações de dieta pobre em gorduras e rica em fibras da American Heart Association e da American Cancer Society para a população em geral.

De modo geral as pesquisas recentes sugerem que a dieta pode desempenhar um papel importante na determinação do risco do desenvolvimento da Esclerose Múltipla e da progressão da doença, talvez o fator dietético mais significativo relacionado à ocorrência da Esclerose Múltipla e ao curso da doença seja a vitamina D.

 

É sabido que a vitamina D funciona para promover a absorção de cálcio para obtenção de ossos fortes. No entanto, pesquisas recentes também sugerem que a vitamina D pode ter efeitos importantes sobre o sistema imunológico e pode ajudar a regular o crescimento e diferenciação celular. Um ensaio clínico está em andamento para determinar o papel que a suplementação de vitamina D pode desempenhar na redução da atividade da doença.

 

Diversos estudos sugeriram um papel para baixos níveis de vitamina D no início e na progressão da doença. A suplementação de vitamina D está sendo avaliada em um ensaio clínico randomizado e controlado para determinar se este aparente relacionamento é real ou coincidente, e se os benefícios potenciais superam quaisquer riscos para pessoas com Esclerose Múltipla.

Outra vitamina que também parece estar associada à Esclerose Múltipla é a Biotina. Em meados de 2015, foi publicado um artigo com o resumo dos resultados preliminares de um ensaio clínico na França envolvendo 154 pessoas com Esclerose Múltipla primária progressiva ou Esclerose Múltipla secundária progressiva. Eles receberam uma dose alta de biotina (MD1003) ou placebo inativo por 48 semanas. Os resultados mostram que 12,6% daqueles que receberam o MD1003 apresentaram melhora na incapacidade (usando a escala EDSS que mede a progressão da incapacidade, ou melhora na caminhada cronometrada), contra nenhum dos que receberam placebo, e não foram relatados problemas sérios de segurança.

A biotina é considerada uma forma de vitamina B, e é um componente das enzimas do corpo que ajuda a quebrar certas substâncias no organismo. A biotina, também conhecida como vitamina H, é geralmente obtida a partir de alimentos.

Um fator dietético recentemente associado à autoimunidade foi à alta ingestão de sal. Evidências apontam para a ingestão de sódio como um fator potencial na atividade da doença. O sódio é um componente primário do sal. Em um estudo observacional, pessoas que consumiram uma quantidade moderada ou alta de sódio tiveram uma taxa maior de recaídas e um risco maior de desenvolver uma nova lesão na ressonância magnética do que as pessoas que consumiram uma baixa quantidade de sódio.

Pesquisas em andamento também estão demonstrando uma ligação entre a microbiota intestinal (bactérias em nosso intestino) e a esclerose múltipla. A dieta desempenha um papel importante na formação da nossa microbiota intestinal e também está implicada em várias outras doenças crônicas (diabetes tipo II, obesidade e hipertensão). Há um interesse crescente no possível papel da dieta na autoimunidade e no papel das intervenções dietéticas em doenças como a Esclerose Múltipla.

Outro fator com potencial de risco relatado nos achados científicos para o desenvolvimento da Esclerose Múltipla é a obesidade. A incidência da Esclerose Múltipla parece estar aumentando em todo o mundo, ao mesmo tempo em que a ingestão calórica e o excesso de peso ou obesidade estão aumentando. Nas pesquisas, a obesidade e o tamanho corporal aos 18-20 anos foram associados a um aumento do risco de desenvolvimento da Esclerose Múltipla, assim como o Índice de Massa Corporal (IMC) aos 7-13 anos.

Possíveis mecanismos pelos quais a dieta pode ter um efeito sobre a Esclerose Múltipla

  • Efeitos diretos sobre o sistema imunológico: Pesquisas imunológicas recentes mostraram que o metabolismo desempenha um papel importante na função de vários tipos de células imunes. Além disso, várias células do sistema imunológico têm receptores (estruturas de superfície que permitem que as células se conectem e se comuniquem com outras células) para vários tipos de metabólitos da dieta (vitamina D, ácidos graxos, etc). Assim, a ingestão de certos tipos de gorduras tem sido associada a uma maior inflamação, enquanto a ingestão de ácidos graxos poliinsaturados tem o efeito oposto. O papel potencial dos ácidos graxos poliinsaturados na redução da atividade da doença também foi estudado, com resultados mistos. No entanto como as pesquisas estão sendo realizadas com associação de suplementação da vitamina D, estudos cuidadosamente controlados ainda são necessários para identificar potenciais benefícios e riscos.

  • Efeitos indiretos através da modulação da flora intestinal: As bactérias do intestino metabolizam certos componentes da dieta em ácidos graxos de cadeia curta que, além de ajudar na saúde do cólon, também podem atuar sobre as células imunológicas e tornar as células T mais reguladoras. Além disso, a dieta pode levar a alterações na composição bacteriana do intestino que podem deslocar o sistema imunológico em direção a um estado pró ou anti-inflamatório.

  • Efeitos sobre os componentes do sistema nervoso central: Como mencionado acima, uma vez que o metabolismo alterado pode desempenhar um papel na adaptação do sistema nervoso ao dano, vários alimentos experimentais e dietas estão sendo estudados por seus efeitos nos vários componentes celulares do sistema nervoso central, como os neurônios e outras células gliais. As dietas poderiam ter um papel benéfico ao fornecer fatores que poderiam ser protetores dessas populações de células.

Em linhas gerais, diferentes dietas têm sido propostas como tratamento, ou mesmo curas, para os sinais e sintomas da Esclerose Múltipla. A maioria das dietas consideradas como ajuda para as pessoas com esclerose múltipla não foram submetidos a estudos rigorosos e controlados, e os poucos que foram avaliados produziram resultados mistos.

A maioria das alegações feitas para tratamentos dietéticos é baseada em relatos pessoais, e os benefícios relatados podem ser mudanças que poderiam ter ocorrido sem qualquer tratamento. No entanto:

  • Há alguma evidência de que uma dieta pobre em gorduras saturadas e suplementada com ômega-3 (de peixes gordurosos, óleo de fígado de bacalhau ou óleo de linhaça) e ômega-6 (ácidos graxos do óleo de girassol ou de cártamo e possivelmente óleo de prímula) pode ter algum benefício para pessoas com esclerose múltipla;

  • Um artigo recente de revisão de literatura forneceu informações e evidências atuais para cada uma das dietas mais populares.

  • Algumas dietas especiais podem ser prejudiciais porque incluem quantidades potencialmente tóxicas de certas vitaminas, ou excluem nutrientes importantes. É por isso que é importante consultar seu médico e nutricionista antes de iniciar qualquer dieta que inclua suplementos nutricionais ou vitaminas. Entretanto algumas vitaminas como a D e Biotina são essenciais para a prevenção de novos episódios da doença.

As pesquisas na área da dieta para a Esclerose Múltipla geralmente têm tamanho e design inadequados para fornecer informações úteis sobre as estratégias dietéticas. As evidências disponíveis até o momento, estão relacionadas a fatores dietéticos que são insuficientes para estabelecer a eficácia (como uma determinada dieta ou suplemento funciona no ambiente estruturado de um estudo clínico controlado) ou a eficácia (como consistentemente ou persistentemente as pessoas podem usar uma dieta ou suplemento diariamente).

Fernando Morais
Embaixador da Qualidade em Atividade Física, Exercício e Saúde
Personal Fitness Trainer certifcado pela IFBB
CREF. 092883-G/SP

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